Alysson Paolinelli liderou a transformação do cerrado em um dos maiores polos agrícolas do mundo, impulsionando o agro brasileiro
Na literatura, o termo epopeia se refere a uma sucessão de eventos extraordinários, capazes de provocar admiração e surpresa na trajetória do personagem principal. Se aplicarmos o termo à agricultura brasileira, o nome de Alysson Paolinelli certamente estaria envolvido, como demonstra o livro lançado em agosto deste ano que conta a história do renomado agrônomo.

Nascido em 1936, Paolinelli se formou em agronomia pela Escola Superior de Agricultura de Lavras (Esal), atual Universidade Federal de Lavras (Ufla), e iniciou sua carreira em um momento em que o Brasil ainda lutava para se afirmar como potência agrícola.

Cerrado brasileiro, um vasto bioma de terras áridas e pouco cultiváveis, foi a grande aposta de Paolinelli. Ele enxergou potencial onde muitos viam apenas limitações.

“A partir dos sonhos e das ações de Paolinelli, os Cerrados deixaram de ser solos pobres e se transformaram em um dos mais importantes celeiros do mundo, beneficiando a segurança alimentar global”, afirma Ivan Wedekin, ex-secretário de Política Agrícola e um dos organizadores do livro.

Sua maior contribuição veio nos anos 1970, quando ajudou a liderar a Embrapa, juntamente a Eliseu Alves e José Pastore, e promoveu um projeto inovador de pesquisa e desenvolvimento. Sob sua liderança, foram desenvolvidas técnicas de cultivo que tornaram possível a exploração agrícola do cerrado, incluindo o plantio direto na soja, técnica que revolucionou o manejo sustentável da região.

No plantio direto, as sementes são colocadas diretamente no solo sem preparo prévio, mantendo a cobertura vegetal e preservando a retenção de água, o que resultou em maior sustentabilidade e produtividade.

O Cerrado hoje: um gigante agrícola

Hoje, o Cerrado é responsável por 60% da produção agrícola do Brasil e 22% das exportações globais de soja. Para Wedekin, Paolinelli “teve rara capacidade de mobilizar profissionais e instituições em torno da ciência para modernizar e transformar a agricultura brasileira”.

O sucesso desses projetos não apenas impulsionou a produção de grãos no Brasil, como também estabeleceu o país como um dos maiores exportadores de soja e milho do mundo – o impacto do trabalho de Paolinelli é evidente na atual posição do Brasil como um dos principais players no agronegócio global.

O Brasil, inclusive, deve produzir 169 milhões de toneladas de soja e 127 milhões de toneladas de milho na safra 2024/25, de acordo com as últimas estimativas do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA), um novo recorde, caso seja confirmado.

“Temos a honra de liderar esse importante setor da economia brasileira, tão importante no nosso estado e tão importante no planeta, porque produzir alimentos é algo fundamental para a própria existência humana aqui”, disse à EXAME o governador do Mato Grosso, Mauro Mendes.

Além de suas realizações na Embrapa, Paolinelli também desempenhou papéis importantes em organizações internacionais, promovendo práticas agrícolas sustentáveis e o desenvolvimento da agricultura tropical. Seu trabalho lhe rendeu reconhecimento mundial, incluindo o prêmio de “Personalidade do Ano” na área de Agricultura, concedido pela revista Forbes.

“Se não fosse o Alysson Paolinelli, o Brasil não teria a agricultura que tem hoje”, afirmou Roberto Rodrigues, professor emérito da Fundação Getúlio Vargas e ex-ministro da Agricultura.

Rodrigues, que escreveu o prefácio do livro sobre Paolinelli, reitera que as estratégias do agrônomo para o agro nacional posicionaram a Brasil no cenário global.

“Sem o trabalho de Paolinelli e seus colegas, a revolução agrícola que moldou o Cerrado e o Brasil como um grande produtor agrícola não teria sido possível”, diz ele.

Além de fundar a Embrapa e liderar uma revolução em um dos principais biomas do país, Paolinelli foi secretário de Agricultura de Minas Gerais e ministro da Agricultura durante o governo militar de Ernesto Geisel.

“Embora o reconhecimento de sua importância possa ter demorado a chegar, Paolinelli é amplamente considerado o pioneiro que tornou possível a transformação agrícola no Cerrado e o avanço da agricultura tropical moderna no Brasil”, finaliza Rodrigues.