Resolução do CMN aumentou a expectativa de escassez no mercado; títulos valorizaram em torno de 2,5%
As recentes resoluções do Conselho Monetário Nacional (CMN) sobre as emissões de CRI e CRA, os certificados de recebíveis imobiliários e do agronegócio, já tiveram impacto sobre o mercado secundário dos títulos.
De acordo com estimativa da equipe de Credit Research do Itaú BBA, as taxas dos papéis incentivados em IPCA tiveram uma redução de cerca de 0,50 ponto percentual desde o dia 1º, quando as resoluções entraram em vigor. Os papéis tiveram uma valorização em torno de 2,5% no mercado secundário ao longo desse período.
“Nos instrumentos que já existem, com liquidez para negociação no mercado secundário, o que o investidor viu foi uma redução da taxa de negociação, que corresponde a um ganho no valor de mercado nesse título”, explica Ciro Matuo, do Itaú BBA.
“Um primeiro efeito dessas medidas foi a percepção da escassez, no futuro, desses títulos incentivados. Talvez quem tem esses títulos não consiga refinanciar. É por isso que esses papéis ficaram mais caros no mercado”, completa o analista.
Mercado de novos CRI e CRA recalcula rota e já se adapta
Fontes do mercado ouvidas pela Inteligência Financeira afirmam que o anúncio de mudanças já era esperado, dado o incômodo do governo com o uso ampliado de CRI e CRA. Esses papéis são isentos de impostos para pessoas físicas, e são usados por empresas que não pertencem aos setores priorizados. No caso, o imobiliário e o do agronegócio.
No entanto, surpreendeu o fato de a decisão do CMN ter vindo com impacto imediato. Operações que estavam sendo preparadas para o registro junto à CVM tiveram que ser suspensas.
“Existia a expectativa de ter um período de adaptação. Tinham operações em andamento, mas o que as pessoas não imaginavam que seria algo de cortar a corda imediatamente”, avalia Mara Limonge, vice-presidente da Apimec (Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais do Brasil).
Ricardo Stuber, sócio da área de Mercado de Capitais do TozziniFreire Advogados, afirma que podemos ter uma escassez de novas emissões num primeiro momento. Contudo, ele afirma que o mercado está sendo rápido em se readaptar às novas regras.
“O mercado está sendo muito rápido para se readaptar. No escritório já temos operações que estão sendo estruturadas dentro dos requisitos da nova norma. Talvez não tenhamos o número de ofertas que tínhamos até então, mas teremos ofertas”, afirma.
Entenda as novas regras para CRI e CRA
CRI e CRA são dois produtos incentivados, ou seja, são isentos de IR para pessoas físicas, criados com o objetivo de atrair investimentos nos setores. Por outro lado, decisões adotadas pela CVM nos últimos anos consideraram que outras companhias poderiam emiti-los, desde que o lastro do crédito estivesse relacionado com a cadeia do agronegócio (CRA) ou imobiliária (CRI).
Por exemplo, varejistas que emitem CRAs para a compra de insumos do agronegócio ou empresas de diversos setores emitidos CRIs para cobrir custos imobiliários. Isso foi restrito a partir da Resolução 5.118, que o CMN publicou em 1º de fevereiro.
Ricardo Stuber, do TozziniFreire, citou três mudanças práticas com a mudança:
- Companhias abertas que não sejam mais dos setores imobiliário e do agronegócio não podem mais emitir CRIs e CRAs. O mesmo vale para partes relacionadas dessas companhias. Pela norma, se enquadram empresas que tenham mais de terços da receita relacionados aos setores.
- CRIs e CRAs não podem mais incluir créditos originados de partes relacionadas. Ou seja, cessão de créditos imobiliários relacionados a empresas do mesmo grupo ficam de fora.
- Os produtos não podem mais ser usados para reembolso de despesas. As empresas não poderão mais emitir dívidas para o reembolso de investimentos. Portanto, apenas para novos investimentos.
De acordo com o Itaú BBA, as 30 maiores emisões de CRA somaram R$ 22,4 bilhões. Destas, mais da metade – 17 emissões – não poderiam ter acontecido pelas novas regras, o equivalente a aproximadamente R$ 16 bilhões.
Por que as mudanças ocorreram?
Há diferentes visões no mercado sobre a pertinência da decisão do CMN e da prática que vinha vigorando até então. Para Mara Limonge, a flexibilização foi tão importante quanto a restrição será agora.
“A flexibilização cumpriu seu papelo porque o mundo agro foi inserido no mercado de capitais com a liquidez do papel. Com isso, surgiram os fundos agros e o assunto começou a ser olhado pela Faria Lima como um todo. Antes, só gigantes conseguiam acessar esse mercado e muitas empresas só conseguiram pela maior liquidez”, afirma a vice-presidente da Apimec.
Por outro lado, a especialista vê que o mercado se tornou grande demais para seguir isento e que as novas regras vão estimular a entrada de novos players dos setores, com a reposição de títulos nas carteiras dos fundos diante dos vencimentos.
“Estava desbalanceado o mercado de isentos versus os não isentos. Vimos CRIs de empresa do setor de saúde que, na verdade, estava com problema de capital de giro e colocava os imóveis como lastro, mas isso não tinha nada a ver com a ideia que se tinha quando se fez a isenção”, avalia Laís Costa, analista da Empiricus Research.
“Para alguns colegas é uma intervenção, mas eu acredito que se corrige uma anomalia”, prossegue. A especialista observa que a nova medida possa, entre outros impactos, estimular o mercado de fundos de crédito, que sofreu com retiradas no último ano.
Para Ciro Matuo, do Itaú BBA, os fundos devem ter menos impacto com as novas regras. “As empresas buscadas pelos Fiagros tem um perfil diferente, são empresas menores, que muitas vezes não tem um rating calculado pelas agências de risco. Essa é uma maneira que os fundos têm para oferecer uma rentabilidade distinta”, diz.
Fonte: https://inteligenciafinanceira.com.br/onde-investir/renda-fixa/cris-e-cras-novas-regras-secundario/